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Foto do escritorFernando Fagá Alves

Ascenção e queda: ATARI

Atualizado: 23 de jun. de 2021

Como o sacrifício do foco no cliente e a ganância corporativa levaram a empresa de maior crescimento dos anos 1980 à falência em menos de uma década


Sou da geração que teve como primeiro videogame o Super Nintendo. Desde então, joguei em diversas plataformas. Do Xbox ao Sega. Tudo começou com a Atari. Após ser a empresa de crescimento mais rápido da sua época, rapidamente perdeu fôlego e tronou-se irrelevante.


Continue lendo para saber como isso aconteceu:


Origens


Nos anos 1960, Nolan Bushnell, que viria a fundar a Atari, era um aluno da Universidade de Utah. Lá, teve contato com uma máquina chamada “Space War” para um computador avançado, disponível apenas em centros de pesquisa.


Bushnell era gerente de um parque de diversões local e, imediatamente, percebeu o potencial para criar uma máquina que disponibilizasse o jogo operado por moedas. Infelizmente, na época, o computador custava U$ 1 Milhão. Ele resolveu esperar o desenvolvimento tecnológico fazer o preço dos computadores baixar para criar o produto que sonhou.


Em 1972 o custo dos computadores baixou o suficiente para justificar a criação de uma máquina de jogos de Arcade. Nesse ano foi fundada a ATARI.



O primeiro jogo da empresa foi uma nova versão de Spacewar.


O jogo foi um fracasso. Porém, a empresa contratou nesse mesmo ano Al Alcorn, que criou o jogo “Pong”. Dessa vez, a Atari acertou em cheio e conseguiu começar sua jornada rumo ao topo.



Em 1974 a empresa instalou mais de 8,000 unidades em bares, restaurantes e parques temáticos.


Em 1975 a empresa desenvolveu o Atari Computer System – o primeiro videogame residencial lançado pela empresa. Infelizmente, a empresa não conseguiu escala para lucrar com o console.


Para resolver os problemas financeiros da empresa, Bushnell vendeu a Atari para o grupo Warner Communications, empresa-mãe da Warner Brothers e DC Comics, em 1976 por U$ 28 milhões.


Um adendo: A Atari foi importante para a fundação da Apple


A Atari foi importante não apenas para a história dos videogames, mas também para história dos computadores pessoais. Foi essa empresa aonde Steve Jobs começou sua carreira.




Steve Jobs ficou responsável por desenhar o famoso jogo “Breakout” e convidou seu amigo Steve Wosniak para programá-lo. O jogo, que foi lançado em abril de 1976. Alguns dias antes, Jobs e Wosniak haviam lançado o Apple I. Essa máquina não era capaz de rodar o jogo.


Wosniak não abandonou o desejo de rodar “Breakout” em um computador. O Apple II foi criado com essa meta em mente. Diversos avanços tecnológicos foram feitos para que isso fosse possível. Tais avanços fizeram do Apple II um sucesso absoluto e o primeiro produto de sucesso da história da Apple.



Subida ao topo


Em 1978, Bushnell entrou em conflito com a Warner Communications e saiu da presidência. No ano seguinte, foi contratado Ray Kassar como CEO da Atari.


Meses antes, a empresa deu um salto revolucionário – lançou no mercado o Atari 2600 – o primeiro videogame com cartuchos intercambiáveis, que permitiam que o jogador pudesse escolher dentre diversos jogos.



Com o sucesso, o foco da empresa passou de inovação para marketing. O departamento de P&D foi reduzido para dar lugar a profissionais de marketing. Em 1979 a empresa atingiu U$ 1 Milhão em vendas. Em 1982 a empresa já vendeu U$ 10 milhões.


Veio então a competição. Empresas como Magnavox e Coleco lançaram seus consoles. O computador doméstico também se mostrou uma alternativa aos Videogames. Além de servir para jogos, os computadores serviam para negócios. Também tinham memória para salvar os jogos e os usuários não precisavam começar do zero toda vez que retornavam.



Fuga de cérebros e competição com próprios talentos


Na época, muitos jogos eram criados por programadores individuais que recebiam apenas de vinte a trinta mil dólares por ano e não tinham crédito sobre suas criações. Em 1979, quatro programadores saíram da Atari para lançar sua própria empresa – a Activision.


A nova empresa passou a desenvolver jogos para o console da Atari, quebrando o modelo de monopólio da empresa. A estratégia da Atari era de vender o console barato e ganhar dinheiro nos jogos. O prejuízo foi tanto que a Atari resolveu processar a Activision.

A Atari perdeu o processo e outros estúdios passaram a desenvolver jogos para o Atari 2600. O mercado tornou-se tão atrativo que até mesmo a Quaker e a Purina fizeram jogos. Além de perder receita, a Atari passou a perder seus melhores talentos, que foram assediados por concorrentes.


A fuga de talentos levou a Atari a perder competitividade e foi um dos fatores principais para a falência da empresa.


Atari e a cobiça


Após lançar com sucesso o jogo “Raiders of The Lost Ark”, em 1982, baseado no filme do Indiana Jones, a Atari conseguiu os direitos para lançar um jogo baseado no filme “ET”.

Na época, um jogo levava de 6 a 8 meses para ser desenvolvido. Entretanto, a Atari queria lançar o jogo do ET antes do natal, com o filme ainda em cartaz. O jogo foi então desenvolvido em apenas 5 semanas.


Apesar de ser um sucesso inicial de vendas, o jogo apresentou diversas falhas. O ET ficava caindo em poços infinitamente e era praticamente impossível jogar até o final. Das 4 milhões de cópias vendidas, 3.5 milhões foram devolvidas.


Pouco tempo depois, a Atari comprou os direitos para o jogo de Arcade “Pac Man” e resolveram lançá-lo para o Atari 2600.


A ideia era boa, porém, novamente, o jogo teve que ser desenvolvido em poucos meses. Para resolver esse problema, foi contratado um freelancer externo que recebeu royalties sobre cada unidade produzida (independentemente da produção ser vendida).


A Atari projetou 12 milhões de dólares em vendas. Entretanto, o jogo ficou lento, feio e com diversos bugs. A empresa apenas vendeu 7 milhões de dólares e ficou com 5 milhões de cópias em estoque.


No final de 1982, muitas empresas estavam desenvolvendo jogos ruins e baratos. Os consumidores começaram a ficar ligados e a parar de consumir esse tipo de produtos.


A crise de 1983 e a queda da Atari


Após esses fiascos, a empresa reduziu sua expectativa de crescimento de 50% para 10%. Foi um grande choque em Wall Street.


O mercado de videogames entrou em declínio com a competição extrema e com a descrença dos consumidores.


Nesse ano, a Atari enterrou milhares de cópias de fitas de videogame não vendidas em um aterro no Novo México.


A empresa perdeu a credibilidade e ficou com uma dívida de 500 milhões de dólares – um valor exorbitante para a época.


Diversas empresas saíram do negócio de videogames e, na época, passou-se a acreditar que os videogames deixariam de existir, dando espaço para computadores pessoais cada vez melhores.


Novas tentativas


A própria Atari entrou na onda do computador pessoal e teve um sucesso moderado na Europa com o Atari ST. O principal diferencial desse PC era seu software para produção musical. Entretanto, o modelo não se mostrou competitivo.


Em 1993, a empresa tentou novamente mudar o mundo com seu console Jaguar, de 64 bits. Pouco tempo depois foi lançado o Nintendo 64, com qualidade muito superior.


Nenhuma dessas tentativas realmente recuperou a empresa e ela continuou se arrastando, sem conseguir reverter seus prejuízos.


Hoje em dia


Quem investiu na Atari nos anos 1980 viu o dinheiro virar pó. Tudo que restou foi o nome, que foi comprado pela Infogrames.


O nome Atari nunca chegou a realmente morrer, mas não retornou aos seus tempos de glória. A marca foi comprada pela Infogrames, uma desenvolvedora francesa de videogames, e chegou a ser usado em jogos para computador como Roller Coaster Tycoon e Civilization. Entretanto, o nome não está mais relacionado ao que já foi a empresa.


Conclusão


Um dos pontos menos explicados dessa história são os motivos que levaram Bushnell a deixar a Atari. Provavelmente, o fundador da empresa percebeu que o Grupo Warner estava excessivamente focado em lucros. Uma empresa nunca deve virar as costas para seus clientes.


Eu cresci nos anos 1990 e nem conheci a Atari quando criança. Se a empresa não tivesse perdido o foco e a visão, poderia ter sido no mínimo um competidor formidável para a Sega e a Nintendo (e posteriormente para a Sony e a Microsoft).


Aos fãs de videogame, resta imaginar o que poderia ter sido. Aos responsáveis pela estratégia em suas empresas, ficam as lições da sessão abaixo.



Principais lições


Não subestime seus consumidores


A Atari subestimou seus consumidores. Acreditou que eles consumiriam qualquer jogo apenas por associação com marcas populares. No curto prazo, essa estratégia funcionou e tanto o jogo E.T. como Pac-Man tiveram sucesso. No longo prazo, a empresa foi abandonado por sua fiel base de seguidores (que se sentiu traída)

Não subestime seus talentos

Durante o período em que Bushnell conduziu a Atari, a empresa tinha uma cultura forte e viva. Deixava os seus programadores trabalharem o horário que quisessem e fazer festas dentro do prédio. Trabalhava-se duro, mas divertia-se bastante. Foi o tipo de mentalidade precursora de empresas modernas de tecnologia como Google, Salesforce e Facebook.

Com a Warner Communication, a força de trabalho começou a se sentir desvalorizada e a cultura erodiu. A fuga de talentos levou à criação da competição e ao enfraquecimento da Atari

Apenas a inovação constante garante posição de mercado


A Atari sossegou em seus louros quando desenvolveu o melhor videogame da época. A própria indústria se estagnou por anos, até o lançamento do console NES da Nintendo. Ao demitir o P&D para gerar espaço financeiro para o Marketing a empresa cresceu rapidamente no curto prazo, mas deixou uma bomba-relógio explodir no longo-prazo.


Quer saber mais?


Se você ficou curioso em saber mais sobre a história da Atari, recomendo assistir a série High Scores do Netflix, assim como o vídeo abaixo:



No vídeo abaixo, você pode saber quais foram os principais jogos que fizeram história nesse console :





Fernando Alves é mestre em negócios (FT-MBA/2019) pela University of Southern California e bacharel em economia pela FGV. É o fundador da PilarX – consultoria de inovação e marketing.


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